Confesso que já não tenho o mesmo interesse pelos destinos do petismo que tinha até o impeachment. Na verdade, seu destino foi traçado na divulgação daqueles grampos em que se mostrou, com toda a vulgaridade envolvida, como a turma operava. A partir daí, foi tudo consequência. Não tive dúvidas no dia que o governo tinha acabado e que, uma vez fora do governo, não tinha mais como o partido manter sua força. Se tornou grande demais e pesado para viver sem nosso dinheiro.
Hoje tem um grande confronto em Curitiba. Mas não se trata da narrativa que parte do jornalismo tenta vender entre Moro e Lula. Trata-se do confronto entre promotores públicos e advogados de defesa em torno da culpa do ex-presidente. Estes sim estão no mesmo nível. Ao juiz cabe julgar, dar a sentença em função da competência de uma das duas partes em provar sua tese. Muito se fala do papel de Moro; acho muito mais importante o papel da promotoria. Mas não é disso que quero falar.
Eu não acredito em qualquer futuro político para Lula por causa da erosão do símbolo. Houve um momento que ele conseguiu construir um avatar que o brasileiro conseguia se identificar. O homem sofrido, que veio do nordeste, que venceu com honestidade, e um pouco de malandragem, que denunciou a corrupção dos políticos, que falou a voz do povo. Este símbolo foi eleito em 2002. O anterior, cheio de raiva e querendo mudar tudo, nunca ganhou nada. Em 2006 apareceu como o homem traído, mas que tinha uma malandragem que caiu bem também com um povo mais cínico, que descobriu com o mensalão que não era possível governar sem algumas concessões. Ganhou de novo. Ele representou nesses dois momentos o brasileiro socialmente dominante, o revoltado com a corrupção mas que não queria perder as conquistas da estabilidade econômica, e o brasileiro mais cínico, que descobria que tinha que ser assim mesmo, que todos roubavam.
Quando houve a famosa condução coercitiva, o Lula de ódio nos olhos voltou, o jararaca. Este a população nunca vai se identificar. Naquele momento eu vi a falta que faz um marqueteiro como João Santana, que nunca deixaria ele dar uma coletiva naquelas condições. Esse Lula fala para a própria militância, mas essa turma não ganha eleições.
Hoje vai aparecer um novo símbolo, o da jararaca no banco dos réus. Não é à toa que os advogados tentaram impedir a filmagem. O Lula acuado, na condição de réu, quebra completamente a aura de mito. Acho que nem vai concorrer em 2018, pois a ilusão de que é imbatível nas urnas é seu último trunfo. Precisa vender a todo tempo que tem o povo ao seu lado, daí a mobilização. Só que dessa vez não está lidando com aqueles panacas do PSDB.
O brasileiro pode se identificar com o sofrido, com o malandro, com o persistente, com o lutador, com o traído. Mas não consegue se identificar com a revolta e nem quer com o fracasso e a decadência, tudo que o Lula é hoje. Por isso seu futuro está destruído, assim como seu passado e presente. Quando elegeu Dilma tinha iniciado um processo de destruição de sua biografia sem saber.
Estamos vendo agora o fim desse filme. Não sabemos o que vai acontecer no particular, mas o símbolo foi erodido. Pode empolgar a minoria militante que vive na revolta constante contra a realidade. Mas o homem comum só vê, com horror, a coisa patética com que ele se tornou.
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